terça-feira, 4 de setembro de 2007

O HOMEM NO BARCO: UMA AVALIAÇÃO COGNITIVA

O desenho se inscreve a meio caminho entre o jogo simbólico e a imagem mental. Através dele a criança expressa sua criatividade, sentimentos e emoções. O interesse pelo desenho, para o estudo psicológico da criança surgiu segundo Seber (1995) a partir da segunda metade do século XX, com os trabalhos realizados por Luquet. Através do desenho Um homem no barco é possível resgatar as teorias de Piaget para um entendimento cognitivo da criança.
Ao efetuar um desenho uma criança não separa a cognição do afeto, quando acorre a separação evidencia-se em casos em que a personalidade tenha sido seriamente dissociada por doença mental. Assim o desenho, e especificamente Um homem no barco são uma expressão de sentimentos e pensamentos que formam uma entidade indivisível. Di Leo (1991) nos diz o seguinte:



“...quando relacionada com um estímulo relativamente neutro, a resposta tende a ser predominantemente cognitiva, embora não inteiramente. E, quando o estímulo for mais pessoal, a resposta tenderá a mobilizar os sentimentos.” (DI LEO, 1991, p. 34)




Em 1887, surgiu em Bolonha o primeiro livro no qual desenhos de crianças reais foram reproduzidos. O autor não era psicólogo, nem pediatra, mas sim um famoso crítico de arte, encantado pela arte infantil. Nele, segundo Di Leo (1991) estão interpretações progressivas do tema Um homem no barco onde se pode ver quatro fases idênticas aos desenhos das crianças de hoje.
O desenho infantil de Um homem no barco vai sofrendo mudanças e se torna mais real a medida que a criança amadurece intelectualmente. As fases conforme Di Leo (1991) são as seguintes:
A primeira fase é caracterizada por uma pessoa que está inteiramente no interior e visível através do casco. O que existe deve ser mostrado. A segunda fase, a figura começa a emergir, primeiro a cabeça, consequentemente a parte superior do corpo aparecem sobre o convés. Mas ainda seguindo a regra de que o que existe deve ser mostrado, inclusive a parte inferior do corpo através do casco.
Tanto na primeira quanto na segunda fase pode-se perceber que a criança desenha conforme o pensamento pré-operacional de Piaget, onde a mesma vê o mundo subjetivamente e desenha um modelo internalizado. A técnica do raio-x ou a transparência é um reflexo aparente no desenho do egocentrismo infantil.
Agora na terceira e quarta fase aparecem mudanças significativas no desenho de Um homem no barco. A terceira fase a criança apresenta uma tentativa de preservar a integridade do corpo através da ilógica da transparência, e para resolver essa questão a mesma desenha a pessoa inteira no convés. Essa é considerada uma fase de transição da criança entre o realismo intelectual e o realismo visual.
Somente durante a quarta fase é que o realismo visual vai se sobrepor ao realismo intelectual, portanto o desenho de Um homem no barco será caracterizado somente com as partes do corpo que são realmente visíveis quando uma pessoa está em um barco. Essa fase segundo a teoria proposta por Piaget cai dentro do estágio das operações concretas, situado usualmente entre 7 e 8 amos de idade. Com base no delineamento teórico enfocado através desse desenho, podemos identificar que na primeira e na segunda fase a criança desenha através do pensamento pré-operacional, a terceira fase é considerada uma fase de transição da criança entre o realismo intelectual e o realismo visual e por fim a quarta fase é que o realismo visual se sobrepõe ao realismo intelectual, levando assim a identificação sobre como a criança amadurece intelectualmente. Portanto, a utilização desse instrumento de fácil aplicação, possibilita ao psicólogo avaliar aspectos do desenvolvimento cognitivo que o orientarão no trabalho a ser realizado com a criança.




REFERÊNCIAS

DI LEO, J. H. A interpretação do desenho infantil. Porto Alegre : Artes Médicas, 1991.
PIAGET, J., INHLEDER, B. A Psicologia da Criança. São Paulo : DIFEL, 1982, 7ª ed.
SEBER, M. G. Psicologia do Pré-escolar, uma visão construtivista. São Paulo : Moderna, 1995.